Ruínas

Olhei em volta quando chegámos, para ter a certeza de que ninguém estava para ali a ver-nos - sim - assenti - vamos treinar a sério - dei uma dentada no pão para não desfalecer enquanto lutavamos e olhei-a - quando quiseres - encolhi os ombros. Estáva com uma nova vontade de lutar que nem parecia minha.

Chegámos às ruínas e como era de esperar não estava lá mais ninguém a não ser nós os dois. Olhei para o Adam que agora parecia muito mais decidido a treinar do que antes, o que me deixava cada vez mais com a certeza de que a decisão dele era a de ir ter com os seus. Não podia fazer nada para o impedir. Assenti com a cabeça e tirei a minha espada do cinto, estendendo-lhe a mesma pelo cabo - Agarra. Vou ensinar-te a lutar com ela.

Agarrei na espada que ela me estendia, olhando para ela de olhos meio arregalados - não me vais fazer usa-la contra ti, pois não? - perguntei retoricamente - se te magoar mais do que já estás - apesar de eu saber que o mais provavel era acontecer o contrário - eles vão-me matar da pior maneira possível.

Revirei os olhos e estendi novamente a espada na direção dele para que ele lhe agarrasse - Antes de a usares seja contra o que for, tens de aprender a usá-la. Agarra. - ordenei chateada - E não tens de te preocupar comigo. - uma partezinha de mim gostava que ele se preocupasse em magoar-me ou que eu me magoasse mas a outra, a parte guerreira que tinha aprendido a sê-lo toda a vida, não gostava que me considerassem fraca. Era por isso que toda a minha relação com o Adam era um grande dilema que eu não percebia na maior parte das vezes.

Engoli em seco, agarrando na espada e olhei-a. Era mais pesada do que parecia mas, felizmente, não deixei transparecer que era estúpido e que não conseguia nem agarrar nela como deve de ser. - Está bem - acabei por dizer, percebendo pelo seu tom que estava a ficar chateada e olhei para as minhas mãos - ensina-me - pedi.

Assim que ele finalmente agarrou na minha espada, coloquei-me atrás dele acabando-me por ficar mais próxima do seu corpo do que numa ocasião normal e apesar de ser um pouco estranho devido à nossa diferença de alturas, que nem era assim tanta mas mesmo assim, posicionei-me de maneira a conseguir colocá-lo de forma correta - A espada é pesada e por isso primeiro tens de te habituar a ela. Tens de a ver como uma extensão do teu braço. - agarrei no braço dele que agarrava na espada e ajudei-o a fazer alguns movimentos simples - É difícil ensinar-te assim, não sei se vou ser muito boa a fazê-lo.

Engoli em seco. Já tinha sido doloroso vê-la nua de manhã, mais do que das outras vezes, agora senti-la praticamente toda colada a mim, ainda que vestida e cheia de proteções, ainda conseguia ser pior. Forcei-me a concentrar na espada que tinha nas mãos e coloquei-me na postura correta esticando o braço em frente com a espada direita e sem erros. - Tu vais - murmruei virando a cabeça na sua direção. - Não te preocupes.

Baixei a mão quando o Adam começou a ver os movimentos sem precisar da minha ajuda, mas continuei encostada a ele para o movimento seguinte. Assenti com a cabeça apesar de ele não o ver. Quando eu tinha aprendido a lutar e a defender-me, tinha-o feito a sério, como todos na tribo aprendiam mas não conseguia ver-me a fazer o mesmo para o Adam; ia chegar a altura mas ainda era demasiado cedo - Espero que tenhas razão. - saí de trás dele e coloquei-me à sua frente - Vamos fazer devagar. Defende e ataca. Como fizemos antes mas com a espada agora. - disse antes de esticar o meu braço com o punho cerrado em direção ao seu ombro, muito mais devagar do que se fosse um ataque a sério.

Olhei-a quando foi parar à minha frente e cheguei a sorrir ligeiramente, até perceber que ela estava a falar a sério. Não podia voltar a hesitar, ela ia fartar-se, ela não tinha muita paciência e eu não podia voltar a dizer o mesmo. Dizer que não precisava de se importar com ela. Engoli em seco vendo o seu punho vir na minha direção e tentei afasta-lo com a espada, tentando não a magoar. Que merda, eu só estava a fazer figuras de otário, ela devia rir-se de mim à noite enquanto eu dormia.

- Boa. - elogiei quando ele fez aquilo que eu tinha dito e voltei a repetir o movimento, desta vez fazendo pontaria a outra zona do seu corpo - Eu sei que estás preocupado com muita coisa mas não faz mal. - levantei o meu olhar de maneira a olhá-lo nos olhos - Nunca tiveste de aprender a lutar é normal que não o saibas fazer e que tenhas mais dificuldade. - mordi o interior da minha bochecha antes de voltar a falar - Mas já sabes que as pessoas como tu estão vivas por isso tens de ver isso como uma força para dares o teu melhor.

Fitei o seu punho, não me deixando ficar convencido com o seu elogio. Para mim, aquilo não era nada bom. Deixei a ponta da espada virar-se para o chão depois de me ter defendido e de novo. Era fácil quando ela fazia aquilo mais devagar do que devia. - Eu sei - murmurei - mas eles não vão conseguir defender-se.

Afastei-me ligeiramente para trás quando o Adam baixou a espada e suspirei. Eu era péssima neste tipo de conversas apesar de ter sido eu a começá-la, nunca sabia o que dizer ou fazer, principalmente com o Adam - Eles podem não precisar de se defender. Podem vir buscá-los. - encolhi ligeiramente os ombros - E tu também podes não precisar de te defender se fores com eles. Voltas para casa, para a tua família e para a tua namorada.

Voltei a levantar a espada quando aquela conversa começou. Não queria nada falar sobre isso, a minha cabeça estava uma confusão. Estiquei a espada na direção da zona em que ela estava protegida tentando perfura-la sem tentar magoa-la, mas era impossível. Isso era bom para ela, e mau para mim para o caso de alguém que tivesse uma coisa daquelas e me atacasse.

Finquei os pés no chão de maneira a não andar para trás quando ele voltou a levantar a espada e tentou espetar a mesma na minha proteção do ombro, não conseguindo fazer absolutamente nada da mesma, tal como era suposto - Tu também precisas de roupas mais decentes. - sabia que muitos não iam gostar da ideia de ver o Adam vestido como nós mas para todos os efeitos ele era um dos nossos - E de cortar o cabelo. Posso fazer isso agora, continuamos o treino amanhã. - era o melhor tanto para mim como para ele porque sabia que depois do que tínhamos visto do outro lado da ilha, nenhum de nós estava com grande cabeça.

Dei-lhe a espada para as mãos de novo e assenti. Não me apetecia nada ter uma daquelas coisas, mas estava cansado de parecer um menino assustado e de precisar da proteção dela. Agora, que sabia que eles estavam vivos, ainda estava mais farto. Passei as mãos pelo meu cabelo, com um breve sorriso - sim, amanhã de manhã - disse para ter a certeza de que ela não se esquecia e comecei a andar de novo até à nossa tenda.