Clareira

Baixei o olhar quando senti a mão do Adam agarrar a minha mas rapidamente voltei a levantar o meu olhar para o seu, pronta para protestar quando me lembrei que não estávamos só nós os dois naquela caminhada - Está bem. Há uma clareira ali à frente. - disse caminhando em direção à mesma e assim que lá cheguei sentei-me na relva para retirar as coisas que tinha trazido que eram apenas algum pão e água.

Sorri ligeiramente por não a ter deixado resmungar, como sempre. - Gally - chamei quando se começou a afastar e fui atrás de Freya que nos levou até à clareira gigante. Nunca tinha ido para ali, a ilha era maior do que parecia e aquela zona ainda era mais bonita do sítio onde a tribo estava instalada. Sentei-me na relva, acabando-me por deitar e olhei para o céu - vamos fazer de Edward e Bella - gozei sabendo perfeitamente que ela não conhecia o pior vampiro de sempre. - Vocês têm alguma lenda de pessoas que bebem sangue de outras? - perguntei mordiscando o lábio inferior para não me rir.

Dei um pão à Gally assim que ela se sentou ao meu lado e juntei as sobrancelhas quando o Adam se deitou e começou a falar sobre pessoas que eu não conhecia de lado nenhum - Quem são esses? Também são namorados? - perguntei tentando perceber do que é que ele falava e depois calei-me para pensar na pergunta que ele me tinha acabado de fazer - À vários anos um guerreiro bebia sangue dos inimigos. Mas nunca ninguém mais fez isso.

Ri-me das suas perguntas e encolhi os ombros - são, mas eu estou só a brincar. - sentei-me de novo agarrando num pão que ela tinha trazido e parti-o ao meio comendo um bocado de cada vez. Como eu tinha saudades de nutella. Suspirei só de pensar e só desviei o olhar na direção de Freya quando ela me respondeu - a isso nós chamamos vampiros - ri-me - eles não existem mas nos livros dizem que não podem andar ao sol e bebem sangue de humanos. São super rápidos, super fortes e assim...-

Assenti com a cabeça apesar de ainda estar confusa em relação àquele assunto e dei também uma trinca no meu bocado de pão. Ainda bem que tinha trazido a mais, mesmo não contando com a Gally na nossa caminhada. Voltei a olhar para o Adam e assenti com a cabeça - Ele também era rápido e forte mas andava ao sol. Não era isso, um vampiro.

-Vocês são todos rápidos - comentei com um pequeno sorriso e dei a outra metade do meu pão a Gally. Eu tinha comido um antes e não me estava a apetecer nada agora, a paragem tinha sido só para acalmarmos todos os ânimos. - Isso não existe - encolhi os ombros - é uma lenda e está nos livros.

Assenti com a cabeça, percebendo um pouco melhor o que ele estava dizer e arrumei tudo assim que apenas a Gally estava a acabar de comer. Precisávamos de continuar a nossa caminhada ou íamos demorar muito tempo e íamos acabar por chegar bastante tarde ao acampamento, o que faria com que entretanto dessem pela nossa falta, se não o tivessem feito já - Estou a perceber. Vamos continuar? - perguntei de olhar fixo no Adam.

-Vamos - levantei-me olhando para Gally que sorriu e veio logo a correr atrás de nós. - Ela não os pode ver - disse a Freya, um pouco mais à frente da menina - então quando estivermos perto eu entretenho-a e tu vais ver o que é que se passa - ela não precisava da minha autorização para isso, por isso, não estava preocupado - depois se alguém te descobrir - o que eu duvidava - podes chamar-me.

Levantei-me e recomecei a caminhar ao lado do Adam, enquanto a Gally ia à frente toda feliz. Para ela isto era um dia maravilhoso uma vez que devia ser a primeira vez que saía do acampamento e nunca se tinha afastado tanto como agora. Olhei para o Adam quando ele começou a falar e assenti com a cabeça - Mas como é que eu sei o que é que aconteceu? - se as pessoas tinham vindo num barco estranho como o do Adam eu sabia distinguir mas se fosse outra coisa qualquer do mundo dele eu não fazia ideia do que seria - Eles não me vão ver. - disse logo com um revirar de olhos.

Encolhi os ombros com uma careta - sem falar com eles ninguém vai saber bem o que é que aconteceu, mas acho que não tens isso na tua ideia pois não? - perguntei tendo o cuidado de olhar de vez enquanto para Gally. Se ela se perdesse ainda ia dar mais problemas do que já tínhamos. - Pode ter sido um avião, ou um barco - encolhi os ombros - mas para tanto fumo deve ter sido um avião - pensei alto - tu sabes o que é um avião, já te avisei sobre eles. Parecem aves quando passam por cima de nós - eu estava sempre a olhar para o céu, à espera que um aparecesse.

- Claro que não vou falar com eles. - disse num tom de resmungo, voltando a sentir-me irritada pelo simples facto de pensar que podia haver mais gente como o Adam e que ele quisesse ficar lá com eles - Só se quiseres que eles morram. - disse entredentes antes de acelerar o passo para me aproximar mais da Gally que ia uns bons metros à nossa frente, antes que ela se perdesse e fosse uma trabalheira ainda maior - Está bem, eu vejo se foi um pássaro grande.

Mordisquei o interior da minha bochecha desviando o olhar dela para o chão e comecei a sentir-me ligeiramente envergonhado comigo mesmo por chegar a pensar que ela os ia proteger. Quer dizer, ela é capaz de manter a paz enquanto eles cá estivesse - se é que havia alguém - mas protege-los? Nunca.
Assenti quando falou do pássaro grande - Está bem, vais perceber logo se foi. - acho que até eu ia perceber, era óbvio que tinha sido alguma coisa em terra, caso contrário não haveria tanto fumo.

O silêncio instalou-se entre nós, à excepção dos barulhos que a Gally ia fazendo enquanto saltitava à nossa frente. Era estranho como é que ela ainda não estava cansada daquela nossa caminhada mas tinha a certeza que o pior seria para voltar. Assenti com a cabeça quando o Adam voltou a falar mas não disse mais nada. Tinha-lhe dito que não queria que ele fosse embora, tinha sido estúpida e fraca e estava na altura de parar de me lamentar e me comportar como uma líder a sério. Ou futura líder.

Não consegui falar mais, os meus pés estavam a doer por não estar habituado a andar tanto sem paragens, mas não me queixei, não valia a pena fazê-lo e não me apetecia abrir e fechar a boca enquanto expelia sons que para ela eram metade desconhecidos. Limitei-me a andar ao mesmo passo que Freya, olhando para o céu algumas vezes para perceber se já estávamos perto e, quando chegou a um ponto em que um cheiro podre me fez quase vomitar eu parei.
-Que cheiro é este? - perguntou logo Gally vindo na nossa direção.
-Vem para aqui Gally, vamos começar o nome jogo - ela olhou para nós, confusa e eu agarrei em ambas as suas mãos olhando para Freya. - Estamos perto. - Percebia-se pelo cheiro o que tinha acontecido. Muitas pessoas tinham morrido, por isso, as minhas esperanças desceram a pique.

Conseguia sentir o cheiro mesmo quando ainda estávamos um pouco longe. O cheiro a queimado, a carne queimada que eu não sentia à imenso tempo a invadir as minhas narinas. Olhei para a Gally e chamei-a para perto de nós - Eu vou lá. - disse tirando a minha espada do cinto para a ter na minha mão, o cabo apertado contra a mesma o que me fazia sentir segura naquele ambiente completamente desconhecido para mim - Fiquem aqui. - disse antes de me afastar deles.

Gally olhou para mim, confusa depois de ter visto a sua futura líder afastar-se de nós de espada na mão. - Está tudo bem, ela foi tratar de uns assuntos de líder enquanto nós fícamos a jogar ao.... - mordi o lábio inferior tentando pensar nalguma coisa que já tivesse jogado com ela - pulgar assassino! - agarrei numa das suas mãozinhas rindo-me quando ela fez o mesmo e aproveitei-me da sua inocência e da sua distração para nos esconder-mos atrás de uns arbustos.

Caminhei a passo rápido mas sem fazer qualquer tipo de barulho tal como tinha sido ensinada em pequena. O cheiro começava a tornar-se mais intenso à medida que me aproximava do local e graças a todas as árvores e vegetação eu conseguia passar completamente despercebida. Quando me encontrava demasiado próxima deixei-me estar atrás de um arbusto onde conseguia controlar perfeitamente o que se encontrava do outro lado, do lado deles. Haviam bocados de metais de onde provinha o fumo, do que parecia ser tal como o Adam tinha dito, um pássaro gigante. Se os pássaros fossem assim tão feios e esquisitos. A segunda coisa que reparei foi em todos aqueles corpos carbonizados e mesmo os que não estavam mas que se percebia perfeitamente que já não estavam neste mundo. Era horrível, mesmo que eles não fossem da minha gente. Ajeitei-me melhor de maneira a conseguir ver o que se passava do outro lado onde haviam várias pessoas a mexerem-se de um lado para o outro. Apertei o cabo da espada com mais força e suspirei. Eles estavam vivos, as pessoas do Adam tinham sobrevivido, não todos mas alguns. Ele podia voltar para casa.

Olhei para a zona onde Freya tinha desaparecido, engolindo em seco. Nem sabia bem no que pensar, a minha cabeça estava uma confusão, tinha um nó num cérebro que não me permitia pensar direito. - Ganhei! - voltei a prestar atenção a Gally que estava toda feliz por ter ganho o pulgar assassino e revirei os olhos por me ter distraído - És um fraco, Adam - disse ela toda contente. Semicerrei-lhe os olhos agarrando nela e só não lhe fiz um ataque de cócegas porque ela fartava-se de gritar. - Andas a aprender com eles a chamar-me isso? - perguntei abraçando-a, para ter melhor visão sobre o que estava à minha volta.
-Não, eu sei que não és fraco - sorriu ela.

Voltei a guardar a minha espada e meti-me direita, escondendo-me entre toda aquela vegetação apesar de eles estarem bastante longe para dar pela minha presença mas mesmo assim. Voltei a caminhar até ao local onde tinha deixado o Adam e a Gally - Adam? - chamei de maneira a que ele se afastasse da Gally e viesse ter comigo para que ela não ouvisse aquela conversa - Prepara-te, vamos voltar.

Levantei-me assim que ouvi Freya e afastei-me um pouco de Gally que parecia estar mais apagada, provavelmente de tanto salto que tinha dado até chegarmos ali. Aproximei-me um pouco de Freya para ouvir o que ela tinha a dizer, com o coração aos saltos, não pela proximidade, mas pelo que ela poderia vir a dizer-me - então? - perguntei - viste alguém vivo?

Olhei por cima do ombro do Adam para ver a Gally que estava demasiado sossegada no sítio onde ele a tinha deixado, de certeza já demasiado cansada para fazer o caminho de regresso pelo seu próprio pé. Voltei a minha atenção para o Adam ao ouvir a sua voz e mordi o interior da bochecha, demorando algum tempo a responder às perguntas que ele tinha acabado de me fazer. Não lhe ia mentir, nunca lhe tinha mentido mas estava a voltar a sentir aquele aperto no meu peito e a impressão na barriga pelo facto de saber que ele podia muito bem agora decidir querer ficar com eles. Assenti com a cabeça - Sim. Morreu muita gente mas há alguns vivos. - acabei por responder com um tom mais baixo que o costume.

Levantei o olhar por cima dos ombros dela, apetecia-me ir ver o que se passava, ajudar feridos e... fazer todo o tipo de coisas, mas não podia. Não podia por várias razões, a primeira era porque não podia deixar Freya ir sozinha, não era como se fossem sentir a minha falta, mas assim que todos soubessem que havia mais pessoas, ainda que por pouco tempo, eu tinha que estar preparado. A segunda era porque Gally era demasiado inocente e apegada a mim para eu a deixar agora. - Vamos - murmurei indo ter com a miúda. Agarrei-a ao colo percebendo que estava pronta para dormir e comecei a andar no sentido contrário.

Fiquei à espera da reação dele mas não recebi absolutamente nada. Isso queria dizer que ele tinha mudado de ideias e que ia ficar connosco? Seguramente que não e não valia de nada ficar com esperanças para depois sofrer mais tarde com a verdade. Segui-o com o olhar enquanto se afastava de mim e ia pegar na Gally ao colo e recomecei a andar, desta vez em direção ao acampamento que tínhamos deixado - Não estás feliz?

Olhei para Gally que já dormia mais ferrada que eu em alguma das noites que tinha ali passado. Mordisquei o meu lábio inferior, encolhendo os ombros -estou - murmurei desviando o olhar na sua direção - mas não podemos ser irracionais. Temos que saber o que fazer. - engoli em seco - vais contar ao teu pai? - se ele já não tivesse descoberto.